terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

INVESTIDOR OU CONSUMIDOR? – COMO DIFERENCIAR QUANDO O CONTRATO É AMBIGUO?


Os negócios imobiliários são complexos, principalmente quando se trata de uma relação com construtoras, incorporadoras e imobiliárias que ofertam empreendimentos em construção na promessa de uma entrega futura através de formas diferentes.
É um fato que, quem adquire um bem imóvel, em um sentido amplo é um investidor. Contudo, nem sempre o interessado em um determinado empreendimento nem sempre tem acesso à todas as informações e garantias legais, sendo comum em casos de incorporações que não observem os critérios da Lei 4591/64, enquadrar todos os adquirentes como “investidores”, quando na realidade muitos são “consumidores”, desvirtuando a proteção legal de consumo ao ofertar uma forma de aquisição sem que seja observada a legislação de maneira adequada.

Ambos investem um expressivo valor na busca de ter acesso à unidade(s) imobiliária(s) ao término da obra, mas em geral, o Investidor adquire essas unidades com o interesse na renda ou lucro pela comercialização futura da(s) unidade(s), aproveitando o custo-oportunidade de adquirir o bem em construção.

Ou seja, o Investidor atua como um financiador privado da obra, e com isso, também assume os riscos do empreendimento, ou seja, mesmo não possuindo uma relação societária com a construtora ou incorporadora, investe valores nas unidades à um valor reduzido compondo o montante necessário para a obra com o cunho de exercício de atividade econômica, ou seja, participar de uma percentual pela venda das unidades da obra; adquirir uma ou mais unidades para comercializar posteriormente esse bem com lucro ou explorar a atividade locatícia.

Para isso, muitas vezes firma um contrato de sociedade, seja de maneira ostensiva ou oculta, investindo os valores de maneira pactuada, tendo como garantia as unidades ofertadas em montante equivalente à um custo mais baixo para propiciar um melhor fluxo de caixa para soerguer a a obra.

Nesses casos, inexiste irregularidade em pessoas físicas ou jurídicas se organizarem em um investimento privado objetivando a construção de um edifício que será posto à comercialização após seu término, mesmo sem o devido registro imobiliário, pois compartilham dos riscos do empreendimento de maneira proporcional ao seu investimento.

Sua relação contratual é protegida pelo Código Civil em decorrência da forma e do próprios acordo de vontades, não podendo este ser confundido como Consumidor, por não se tratar de uma relação de consumo, mas de um contrato de sociedade comum, justamente para afastar uma eventual manipulação especulativa de rescisão contratual com base nas premissas e garantias do CDC caso o resultado do investimento não atinja o valor esperado, na eventualidade de retração de preços das unidades imobiliárias transacionadas e que coloca em risco o próprio empreendimento e/ou incorporadora.

Na eventualidade de rescisão, deve-se observar a sua participação ou não na atividade econômica e a tendência de imutabilidade das obrigações assumidas, devendo ponderar acerca das causas da rescisão de forma paritária e sob luz da convenção (e intenção) das vontades.

Por sua vez, o Consumidor Imobiliário é aquele que adquire um imóvel como destinatário final e que está sujeito às práticas comerciais que afaste direitos já garantidos em lei, omitindo informações sobre o empreendimento, especialmente, quanto ao registro imobiliário do empreendimento, colocando-o em uma condição de vulnerabilidade por não ter acesso à condição de regularidade do empreendimento e dos riscos sobre o resultado pela ausência do registro da incorporação, permitindo assim, garantir a proteção de seus direitos.

A irregularidade decorre justamente da inobservância da lei, compelindo o consumidor à firmar um contrato de adesão em que é enquadrado como “investidor” quando na realidade, se trata de um contrato de compra e venda imobiliária que afasta os direitos como consumidor e possibilite o arrependimento, a devolução de valores pagos e a melhor interpretação das cláusulas abusivas.

Esse artifício contratual mitiga direitos do consumidor colocando-o em um negócio jurídico comum de investimento, omitindo cláusulas de direitos, quando na realidade, se trata de uma relação de consumo com a proteção e reparação de danos patrimoniais e morais advindos da ausência de informação adequada e majoração do risco, sendo necessário o ingresso de um procedimento judicial para que tal condição seja regulada sob a luz do Código de Defesa do Consumidor.

A proteção do Consumidor Imobiliário possui diversas vertentes, seja pela imputação de crime ao ofertar as unidades ao consumo de maneira ampla e geral de um incorporação sem fazer o registro do empreendimento no Cartório de Registro de Imóveis (Art. 65 da lei de incorporações), podendo responsabilizar toda a cadeia de consumo, quais sejam: aqueles que desenvolvam atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, ou comercialização das unidades residenciais, seja pela proteção conferida pelo CDC e sua interpretação pelos Tribunais, a exemplo da Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça que assim dispõe: Súmula 543 - Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. (SÚMULA 543, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/08/2015, DJe 31/08/2015)(DIREITO DO CONSUMIDOR - CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL)".

Assim, antes de adquirir um imóvel, é recomendável observar a natureza dos compromissos de compra e venda. Se a natureza for de sociedade, a possivelmente a posição do adquirente é de investidor. Caso a natureza seja efetivamente de uma unidade em um contrato de promessa de compra e venda, com as cláusulas expressas, inclusive com a descriminação de retenção de um percentual nunca superior à 30% dos valores pagos para a hipótese de desfazimento do negócio por iniciativa do adquirente, sem culpa da vendedora, é bem possível que seja um contrato de consumo.

Boa sorte nas negociações.

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